quarta-feira, 8 de novembro de 2017

A ficção e a realidade

A Ilha, ilusão ou realidade?




O filme “ A Ilha” não é um marco no cinema, porém é um filme simples de onde um olhar mais atento pode e consegue fazer um link com a nossa realidade. Muitos ao verem um filme conseguem captar dele ferramentas que possam utilizar no dia a dia, seja a observação simples de como as pessoas se comportam diante de algo novo ou como o filme apresenta determinados pensamentos que realmente traçam linhas paralelas entre a ficção e a realidade. Apesar de simples e com um final nada especial, esse filme é na verdade uma “ilha” de possibilidades éticas e morais, passiva, revoltosa entre tantos outros atributos que podemos enxergar.

É uma ficção –ainda – sobre a clonagem e a doação de órgãos . Seres humanos são clonados e “vivem” isolados do mundo, que segundo lhes é informado, passou por uma catástrofe e ali seria o lugar mais seguro para os sobreviventes. Porém há inúmeras regras nas instalações: 

  • não poderem se tornar íntimos,(as relações amorosas entre os clones são proibidas e podem ser punidas)
  • não questionamento ( que igualmente leva a atos de punição)
  • a alimentação é balanceada (somente para que os clones não adquiram doenças e permaneçam saudáveis)
  • os exercícios obrigatórios (para uma vida mais saudável)
  • os uniformes idênticos ( como uma forma de não percepção da existência dos clones pelos guardas e demais trabalhadores das instalações)
  • tratamento psicológico obrigatório (sem perguntas , sem revoltas)
  • trabalham em laboratórios sem saberem contudo, o que é feito ali


A única diversão, se assim poderia ser chamada, é a Loteria, que levaria o ganhador para uma “Ilha”, paradisíaca, local para onde todos os sobreviventes seguem felizes na esperança de ver o mundo novamente.

O que o sorteio oferece realmente ao ganhador não é sua liberdade das regras impostas, mas a morte (assassinato do clone) para a retirada dos órgãos para o verdadeiro “Mantenedor” de sua existência. Sim, os clones apenas são criados para que seus órgãos sejam retirados caso o “original” adoeça.

Existem muitos outros filmes que exploram essa linha de pensamento, mas o que nos chama a atenção é a ideia de criar Clones – VIDA – para a morte e assim tentar salvar outra vida. É possível notar que a vida dos clones não possui qualquer valor, não existe ética, moral ou piedade em relação a sua existência ou a sua morte.

Ewan McGregor, o Lincoln de “A Ilha” foi clonado das células de um milionário que se preocupa somente consigo mesmo e a quem é impossível ver no clone um ser vivo e não apenas um baú com peças sobressalentes, das quais pode se utilizar caso adoeça devido seus excessos e extravagâncias.

Contudo o que é claro para quem assiste é que o apelo moral e ético do filme só é levado em conta porque os clores são seres humanos, pois testes como estes já vêm sendo realizados em animais.

Como nada que se faz nos animais acaba sendo visto como uma ação antiética, cientistas já estão dispostos a construir instalações e clones como em “A Ilha”, mas com residentes suínos.

De que forma?

De forma muito semelhante ao que podemos ver no filme de Ewam McGregor: a clonagem de seres vivos para o uso de seus órgãos em pessoas que poderão pagar por eles, já que sabemos : a Ciência não faz nada de graça.

Porque dizemos que a Ciência não faz nada de graça? 

Porque vemos sempre na TV muitos cientistas alegarem que usam animais em testes para beneficiar os seres humanos, porém ao descobrirem algum novo medicamento, vacina ou tratamento esta descoberta normalmente é vendida pela indústria farmacêutica por preços absurdos aos quais a maioria da população não consegue arcar, pessoas mais humildes que, no entanto, são seres humanos como outro qualquer.

A quais seres humanos a ciência e as indústrias farmacêuticas realmente querem auxiliar?

Porcos marcados para o abate

Cientistas agora em nome da salvaguarda da vida de seres humanos – tal como no filme “ A Ilha” -  querem inserir em embriões suínos (porcos) células tronco humanas afim de desenvolverem órgãos humanos nesses animais,orgãos que após o sucesso, poderiam ser utilizados na realização de transplantes para seres humanos. Ou seja, a ideia novamente é criar órgãos em vários Lincolns suínos, fazer alguns deles (já pré-escolhidos como no filme) serem sorteados na Loteria que os levaria a Ilha, e ali os matarem para a retirada dos órgãos necessários.

“[...] que permitiriam não apenas a inserção aleatória de células humanas (...) mas durante o desenvolvimento embrionário, a substituição específica de um órgão natural do bicho(sic) por outros indistinguível do coração ou do pâncreas de uma pessoa.”(folha de São Paulo,Reinaldo José Lopes.

Ao ler a  reportagem , sobretudo os comentários dos cientistas, é impossível não lembrarmos da frase de Charles Magel :

“Pergunte aos cientistas a razão da experimentação com animais, e a resposta será: ‘Porque os animais são como nós’. Pergunte a eles por que é moralmente certo a experiência em animais, e a resposta será: ‘Porque os animais não são como nós.’ A experimentação animal repousa sobre uma contradição lógica.” 
Charles R. Magel


E, no entanto ao dar entrevistas entusiasmadas afirmam:

“As estruturas do organismo dos suínos tem tamanho similar ao nosso”


Quantas Ilhas será que nossa Ciência irá criar em beneficio da humanidade? Quando vemos um mundo onde a preocupação principal deixou a muito de ser a prevenção , sendo que a venda de medicamentos ou experimentos fantásticos se sobrepõe a ética cientifica, teremos mesmo liberdade moral para criar Lincolns suínos sem que ver nele uma vida?

Acredito , infelizmente que, no que depender da ciência e da ganancia humana , sim.




Simone Nardi





Referencias

Charles R. Magel (citado em MAGEL apud NEWKIRK, Ingrid. The PETA Practical Guide to Animal Rights: Simple Acts of Kindness to Help Animals in Trouble. Macmillan, 2009, p. 207).
Lopes, Reinaldo José- Folha de São Paulo, sexta –feira, 27 de Janeiro de 2017 –B5-Ciência + Saúde: Cientistas inserem células troncos humanas em embriões de porcos.






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