"Muito pouco da grande
crueldade mostrada pelos homens pode ser atribuída realmente a um instinto
cruel. A maior parte dela é resultado da falta de reflexão ou de hábitos
herdados”.
Albert Schweitzer
Mais uma vez nos vemos motivados a escrever sobre o tema vegetarianismo, pois é
importante que aos poucos as pessoas comecem a se conscientizar da necessidade
de cuidar realmente bem dos animais. O problema é que a imensa maioria não
deseja despertar para esse assunto e ergue verdadeiras muralhas, levantam
pesados escudos e afiadas espadas para reagir ao fato de que, queiram ou não, o
mundo vai evoluir primeiro para o vegetarianismo/veganismo, e não vai parar
mais, pelo menos não por causa da rejeição das pessoas e de seus temores pelas
novas mudanças.
Dentre muitos os escudos levantados, vemo-nos obrigados a falar de uma
comparação desnecessária entre bondade e maldade, quando deveríamos deixar mais
uma vez de lado o egoísmo de pensarmos somente em nós mesmos e nos preocuparmos
com o próximo. Dentro do meio espírita é bem comum ao se tocar no tema
vegetarianismo, que algumas pessoas logo rebatam esse conceito alimentar -
normalmente uma reação de medo ao que é novo - com a frase de que “Chico Xavier
comia carne enquanto que Hitler era vegetariano”, questão essa bem controversa
no que tange a parte da alimentação e que pincelei em um artigo anterior, mas
faz-se necessário esclarecer ainda mais o fato de que essa frase é prejudicial
aos dois lados, ainda mais aos onívoros, já que podemos ver que nem todos os
vegetarianos são como Hitler e nem todos os carnívoros são como Chico.
Devemos
estar atentos que: não ligar a morte de animais ao ato de comer carne, nos
torna negligentes perante esses nossos irmãos. O foco de quem faz alusão a isso
não é a bondade ou a maldade entre vegetarianismo ou onivorismo, mas a exclusão
da verdade de que “Sim, nós maltratamos os animais!”, é assim que eles tentam
finalizar um assunto que pode tirá-los da zona de conforto onde se encontram.
Na verdade Hitler não era vegetariano ético como se costuma repetir por aí ,
normalmente por ter ouvido “alguém” falar essa célebre frase “Hitler era
vegetariano e Chico comia carne”, repetida mais pela falta de conhecimento
concreto sobre o assunto do que por conhecimento de causa, até porque o
vegetarianismo não torna ninguém “santo” nem torna ninguém “assassino”, assim
também, e de certa forma, com o onivorismo[0.1].
O que deveria realmente ser
revisto é o fato de maltratarmos os animais por cinco minutos de prazer
gastronômico, que nos faz mais mal do que bem e que nos incentiva a continuar
matando aqueles a quem chamamos de “irmãos”. Se a carne não faz mal, por que
então o pedido de que em dias de trabalho nas Casas Espíritas os trabalhadores
se abstenham dela?
Mas, voltando ao assunto em questão, alguns historiadores contam que Hitler fez
inúmeros experimentos com animais, matou seu próprio cão e mandou exterminar um
sem número de cavalos para que não se tornassem propriedade dos inimigos da
Alemanha. Um vegetariano ético jamais faria isso. O que prova que, quem se
escuda nessa frase para afastar-se ou simplesmente para menosprezar o
vegetarianismo, desconhece realmente o significado deste conceito.
Mais adiante veremos o que outros historiadores nos falam sobre isso.
Auschwitz começa onde quer
que alguém olhe para um matadouro e pense: eles são apenas animais.
Theodor Adorno [1]
Para Rynn Berry, historiador, fazia parte da propaganda nazista de Goebbles,
seu Ministro da Propaganda, fazer o povo acreditar que Hitler era vegetariano e
um profundo amante dos animais e pelo visto, foi tão bem feita que vem
funcionando até hoje. Outros historiadores também alegam que durante certo
tempo, mais no final da vida[2], Hitler passou a adotar em parte, uma dieta
vegetariana indicada por seus médicos particulares a fim de resolver, ou ao
menos diminuir, alguns problemas estomacais. Biógrafos e cozinheiros por outro
lado atestam que ele tinha uma forte preferência por carne de porco defumada e
salsichas. Conhecendo-se o mínimo sobre vegetarianismo, poder-se-ia de pronto,
alegar que nenhum vegetariano ético teria tais preferências alimentares.
Dione Lucas, cozinheira de Hitler, escreveu um livro chamado "Gourmet
Cooking School Cookbook" (Livro de Receitas da Escola de Culinária Fina),
onde narra que um dos muitos pratos preferidos dele era squad recheado, e
tratava-se nada mais nada menos do que carne de filhotes de pombos. Mais uma
vez, buscando-se o conhecimento pelo verdadeiro conceito do vegetarianismo, é
impossível crer que optando por não maltratar animais, um vegetariano optasse
pelo squad.
A questão não é se Chico por comer carne era um homem do bem e por acreditarem
alguns, que Hitler por ser vegetariano era um homem devotado ao mal. A questão
não é também se Gandhi , tão esquecido por alguns rebatedores do
vegetarianismo[3] , por ser vegetariano - e alguns historiadores o colocarem
como frugívoro - era um homem do bem ou se a falsa ideia de que por ser Hitler
taxado como vegetariano e ter assassinado tantos seres humanos e tantos
animais, demonstra que os vegetarianos são ruins mesmo por escolherem não matar
animais para comer, a questão é que somos irmãos e não temos o direito de
dispor mais das vidas destes seres em nosso benefício, do contrário nos
tornamos tolos ao chamá-los de irmãos. Ninguém que conheça um abatedouro por
dentro voltará a comer carne, a questão é ética, assim como muitos já se
preocupam com o aborto, outros se preocupam com os idosos, outros se preocupam
com os animais, é um ciclo que não pode ser parado. É como dizer que Hitler
tratava bem as crianças apesar de ser assassino de adultos , o que não implica
que por isso você vá igualmente maltratar as crianças só por causa dele. Deixar
de acreditar no vegetarianismo quando se cita Hitler, é fazer exatamente isso,
é dizer: “ Não, eu não quero ser comparado a Hitler porque ele não comia
animais mas matava pessoas, eu não mato pessoas por isso me vejo no direito de
matar animais”. Mas quem nos deu esse direito? Essa é a verdadeira questão,
Hitler não tinha direito de matar as pessoas, assim como não temos direito de
matar os animais.
Cada um tem um patamar evolutivo, é sempre necessário dizer isso para que não
haja melindre, mas faz parte da nossa evolução deixar de nos alimentarmos de
nossos irmãos animais, queiramos ou não, é a evolução, uns o farão mais cedo
outros mais tarde, mas todos o farão, porém escudar-se em exemplos simplórios
como esse faz com que exemplos piores possam surgir dessa comparação, já que
muitos dos crimes que margeiam nossa história foram cometidos por pessoas que
comiam carne. Mas isso, muitos não desejam reconhecer. Se a intenção dos que
usam essa frase é querer demonstrar que o vegetarianismo não torna as pessoas
boas é até aceitável , já que é a conscientização e o aprendizado do amor, da
moral e da ética, que irá nos tornar pessoas melhores, mas se a intenção é
menosprezar o vegetarianismo, comete-se um erro insustentável , pois a
discussão não se encerra com essa frase, ela se estende e nos traz a mostra
inúmeros vegetarianos notáveis, que foram extremamente bons e acabaram por
escolher o vegetarianismo como meio de se harmonizarem com Deus.E agora, como
ficar perante esse fraco argumento em relação a essa frase, se tantos
vegetarianos foram bons, mas não são citados nela?
Lembremos ao falar de vegetarianismo e usarmos o exemplo de Chico, ou de Hitler, que o próprio Jesus é considerado por inúmeros historiadores não apenas
vegetariano ou vegano, mas frugívoro[4], assim como Gandhi, assim como Albert
Schweitzer e como tantos outros que propagaram o bem. Ser bom ou ser ruim não é
questão alimentar, mas é falacioso querer provar que vegetarianos são ruins
porque Hitler, para os que desconhecem sua índole, era vegetariano; querer
provar que outros que comiam carne eram ou foram bons é querer demonstrar de
forma errônea que comer carne não é ruim. Mas comer carne pode para alguns, não
parecer ruim para quem a come, mas é ruim para quem serve seu corpo como
alimento, isso é que não pode ser omitido ou esquecido. Quando aprendermos a
olhar para estes irmãos animais com verdadeiro amor, aí sim entenderemos a
dimensão de bondade que o vegetarianismo nos trará. Escolher ser vegetariano
por ética é escolher o respeito pelos animais, é proporcionar-lhes a liberdade de
viver. Escolher ser vegetariano por capricho, para emagrecer, ficar bonito ou
porque esse ou aquele personagem é ou foi vegetariano, é mostrar total
desconhecimento pela vida dos animais.
Vegetarianismo precisa ser visto como uma questão de misericórdia pelos animais
e não mais como uma questão de saúde ou bem estar pessoal , e misericórdia é o
que a Doutrina Espírita nos pede,dia a dia.
Notas
[0. 1] O onivorismo, se visto pelo olhar do animal e dos vegetarianos, nada mais do que uma forma de assassinato ao qual os seres humanos já se acostumaram, contudo não é mais possível esconder a brutalidade com que os animais são abatidos, basta tentar dizer a quem come carne a forma como os animais morrem para que ele se altere e tente mudar o rumo na conversa, embora ache natural comer carne, nenhum onívoro quer saber como o animal virou bife.
[1] De origem judaica, era filósofo, sociólogo, musicólogo e compositor alemão.
Grande expoente da Escola de Frankfurt ao lado de Herbert Marcuse e Jürgen
Habermas
[2] Muitas biografias de Hitler narram à mudança alimentar para o
vegetariansimo não pelos animais, mas pela saúde, a lógica do pensamento de
quem se escuda no menosprezo do vegetarianismo usando Hitler como exemplo, deve
se questionar o seguinte: Quantas pessoas Hitler matou antes, enquanto ainda
comia carne? Lembrando que ele tornou-se chanceler alemão em 1933 , mesmo ano
em que foi construído o primeiro campo de concentração , a Guerra se iniciaria
então em 1939, a ideia da “Solução Final” teria surgido em 1941 e se iniciado
em 1942, mas muitas pessoas até aí já haviam sido assassinadas e Hitler ,
segundo alguns historiadores, teria se suicidado em Abril de1945. Seria
inválido usar uma personalidade como a de Hitler , ou de qualquer outro, para
julgar ou não o vegetarianismo, mas o medo que se tem dele.Não há, a meu ver,
outro motivo para esse tipo de comparação.
[3] Não apenas Gandhi é esquecido nesse discurso sobre vegetarianismo entre
Hitler e Chico, mas grandes nomes como Buda, Lao Tzu Albert Schweitzer, Max
Heindel, Helena Blavatsky, Alice Bailey, Annie Besan , C. W. Leadbeater,
Einstein, Humberto Rohden , Ramatis, Rynn Berry , Andrew Linzey, Marcel
Benedeti, os essênios, o próprio Cristo entre tantos outros que eram ou
vegetarianos ou frugívoros, pois se abstinham da alimentação carnívora em
respeito e misericórdia aos animais.
[4] Segundo alguns, Jesus alimentava-se somente de frutas e sementes.
Referências
Albert Schweitzer e a Ética para com os animais – Disponível em http://www.anda.jor.br/?p=12752
Animais, Esses Nossos Irmãos - Parte 7 – Disponível em http://feal.com.br/colunistas.php?art_id=70&col_id=28
Dinshah, J. (1974, January). "Book
nook". {A review of Speer, A. (1970). Inside the 3rd Reich (Por
dentro do Terceiro Reich)} Ahimsa, p. 11. [Disponível na American Vegan
Society, P.O. Box H, Malaga, NJ 08328, USA]
História do Vegetarianismo - Europa: Início do século 20 – Disponível em http://www.ivu.org/history/europe20a/hitler.html.
Meyer, R. (1985). "Was
Hitler a vegetarian?" (Hitler era um vegetariano ?) Vegetarian Voice (Voz
Vegetariana), 12 (2), p. 6. (Rudolf Meyer foi um dos presidentes da
Vegetarier Bund Deutschlands) [Disponível na North American Vegetarian Society,
P.O. Box 72, Dolgeville, NY 13329]
Rynn Berry, Why Hitler Was Not a Vegetarian (Porque Hitler não era vegetariano)
– Disponível em http://www.vegsource.com/berry/hitler.html
Egroup Clara Luz - OS ANIMAIS
TÊM ALMA!
Simone Nardi
Redação do blog Irmão Animais- Consciência Humana
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